Crítica:
O Falcão de Malta
Dashiell Hammett
O regresso de um clássico superior deve ser sempre motivo de celebração entusiástica. O Falcão de Malta, uma das obras-primas de Dashiell Hammett, está agora de novo nas livrarias portuguesas, com a chancela O Quinto Selo, décadas depois da Livros do Brasil o ter editado, na icónica colecção Vampiro. Aquando da publicação da obra, em 1930, Hammett era apenas mais um escritor a soldo da revista pulp Black Mask, que publicava histórias negras de crime, violência e sexo. O estilo hardboiled, que ainda hoje define um género de literatura, não era considerado, e as narrativas pareciam estar limitadas ao submundo que exploravam. No entanto, Hammett, e Sam Spade, o detective da história, vieram alterar as coordenadas. Veterano da guerra, ex-investigador e membro do partido comunista americano, Hammett apropriou-se de um modo instrumental do estilo hardboiled, usando-o para retratar, num modo seco e directo que fez escola até hoje, a sociedade americana, cenário privilegiado do mundo capitalista. O que interessava ao escritor era o confronto entre o Poder e a corrupção e o sentido de justiça do indivíduo solitário, que apesar disso não abandona a luta por um mundo melhor, ou, pelo menos, onde as desigualdades e o crime dos poderosos podem ser travados. Spade é o modelo desta luta: aparentemente cínico e amoral, é na verdade uma espécie de justiceiro por conta própria, capaz de resistir a todos os poderes instalados, a começar pela polícia, e de lutar por uma causa que não é capaz de partilhar mas na qual acredita por instinto. É neste contexto que Spade circula, entre uma mulher fatal, Brigid O'Shaughnessy, um ladrão que dá pelo nome de Joel Cairo, Gutman, arquétipo da ganância e da falta de ética, e uma estátua de um falcão. O Falcão de Malta iria transformar-se rapidamente na referência de muitos escritores, a começar por Chandler, e, muitos anos depois, a ser exemplo fundamental da grande novela americana.
José Vegar, Time Out Lisboa, 23 de Abril de 2008
quinta-feira, 12 de junho de 2008
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